Um dos arcos insulares do Pacífico vai de Halmaheira, ao sul das Filipinas, até o Kamtchatka, passando pelos Pescadores, Taiwan, Okinawa, os Ryukyu e o Hokkaido. Vulcânicas, essas ilhas fazem parte do que se denominou o antigo «cinturão de fogo» do Pacífico. É o itinerário aproximativo que percorreu Lapérouse quando deixou Manila em abril de 1787 a caminho da costa de Tartaria e das obscuras regiões do noroeste do Pacífico. Foi um episódio importante de sua expedição - expedição que leio como uma viagem mental -, não apenas por causa da confusão cartográfica que reinava nessa parte do mundo, mas também porque era a única região que tinha «escapado à energia incansável do Capitão Cook». O que Lapérouse queria não era apenas fazer um mapa, mas deixar a sua marca.

 

Então aqui ao longo da Formosa (como era chamada); depois, dobrando a ponta da Coreia; e entrando no mar do Japão: «Entramos finalmente no Mar do Japão e nos estendemos pela Costa da China». Navegar não era fácil, por causa da névoa que envolvia constantemente as costas; fazer levantamentos, impossível; e, às vezes, uma tempestade - o que o Diário de bordo chama de «crise da natureza» - deixa Lapérouse inquieto, pois ele via nisso a chegada da má estação. Lapérouse tinha muito a fazer nesse setor, e pouco tempo: «Era muito importante para nós ter saído dos Mares do Japão antes do mês de junho, época das trovoadas e dos furações que tornam esses mares os mais perigosos do universo».

Ele prossegue em direção ao norte através dos nevoeiros («as névoas aí eram tão espessas e tão constantes como nas costas do Labrador”), esperando o céu clarear, o que acontece – raramente: «Apenas nas paragens de névoas que se vê, mas muito raramente horizontes de tão grande extensão como se a Natureza quisesse, de algum modo, compensar, por instantes de extrema claridade, as trevas quase eternas que estão difundidas sobre todos esses mares».

Enquanto ele se esforça para medir latitude e longitude e para fazer sondagens, ele vê «cinco grupos de rochas em torno das quais voava uma imensa quantidade de pássaros»; depois, um junco japonês com vinte homens da tripulação vestidos todos de azul e «um pequeno pavilhão japonês branco com palavras escritas verticalmente».

Furtivas imagens do mundo ...

Ele teria gostado de passar mais tempo ao longo da costa do Japão, mas o tempo pressiona e um amplo «campo de descoberta » o espera.


A 44 graus de latitude, ele chega ao local que os geógrafos tinham denominado por «estreito de Soya». Mas, Lapérouse descobre que a geografia é completamente falsa.

Os geógrafos que, sobre a relação do Pais dos Anjos com alguns mapas japoneses, tinham traçado esse estreito de Soya, determinado os limites do Yeso, da terra da Companhia e dos Estados Unidos, tinham tão fortemente desfigurado a geografia dessa parte da Ásia, pois era absolutamente necessário terminar todas essas antigas discussões por fatos sem réplica»

Quando eles pisam o solo, Lapérouse e seus homens vêem cervos e ursos aparecendo tranquilamente à beira-mar, e encontram pequenos cestos de casca de bétula - « exatamente parecidos com os dos índios do Canadá » - e raquetes de neve. Ninguém com quem falar e próximo de quem se informar, então, Lapérouse chama esse lugar de «Urso ance » e segue em frente. Aliás, eles pescam, no mar ou nos rios, um pescado tão fácil que os peixes abundantes como « bacalhaus, bacamartes, trutas, salmões, arenques, solhas .. » têm somente « que dar um salto das bordas do mar para as nossas marmitas”. Eles constatam que os pássaros são mais raros nessas regiões, mas eles percebem, no entanto, « corvos, pombas, cordonas, alvéola, andorinhas, papa-moscas, albatrozes, gaivotas, araux, águas-mãe e patos» e Lapérouse nota que os pássaros – gaivotas e biguás – que vemos geralmente em bandos « sob um céu mais feliz » - vivem aqui sozinhos, empoleirados na cimeira de rochedos solitários.

Quando ele chega a encontrar moradores, os da região do rio Amor ou dos Ainu de Sakhalin ou de Ezo, eles lhe pedem para fazer mapas (Ezo é uma ilha ou uma pensínsula ?) ou estabelecem listas de palavras : tebaira (o vento), oroa (o frio), hourarahaüne (nuvens), mâchi (gaivotas), toukochiche (salmão). Lapérouse constata que as ilhas, quando elas fazem traçados, não têm nenhum sentido das mudanças de direção e desenham sua costa como uma linha contínua... Ele se afeiçoa aos Ainus, pois diz que eles têm « polidez, mais doçura, mais gravidade e, talvez, mais inteligência do que em nenhuma outra nação da Europa » - o que era um grande cumprimento da parte de Lapérouse, que estava longe de compartilhar a ideologia do Nobre Selvagem. Ele aprecia o conhecimento que eles têm das plantas, pensa reconhecer uma espécie de cerimônia do urso (« um circo plantado de quinze ou vinte estacas sobrepostas cada com uma cabeça de urso »), admira roupas feitas com pele de salmão, fina como a seda, e acredita que eles vivem de forma anárquica - mas « a doçura de seus hábitos, o respeito que possuem com os idosos não fazem  dessa anarquia um inconveniente».

«É muito difícil, registra Lapérouse em seu Diário de bordo (datando de agosto de 1787) examinar e saber ler os arquivos do mundo». Com essa frase, ele resumia não apenas suas pesquisas no Pacífico norte, mas também qualquer expedição - e a busca pelo saber em geral. Como se sabe, a expedição de Lapérouse terminou por um desastre total em Vanikoro. Mas o Diário de bordo sobrevive – pois Lapérouse, correndo o risco de as mentes pequenas o utilizarem em seu próprio benefício, o enviara, fragmento por fragmento, para Paris. É um monumento. Melhor ainda: o mapa de um espírito em movimento.

Foi o século XVIII quem viu as primeiras expedições europeias ao redor do mundo, as de Cook, as de Lapérouse – de grandes circum-navegações que geram em seu rastro geógrafos, etnólogos, historiadores da natureza, filósofos e escritores. O século XVIII: a idade dos argumentos afiados, antes dos céus de trovoada do século XIX, e a confusão informacional do século XX – que, muito frequentemente, faz somente encobrir a morte da alma e a secura de espírito absolutamente totais.

É uma época à qual uma massa de informações novas se combina com linhas de inteligência para criar um pensamento vivo, que se expressava principalmente sob a forma de ensaios, desde o Ensaio sobre o entendimento humano de Hume até o Ensaio sobre a teoria das torrentes de Fabre. Tanto mais exaltantes e estimulantes do que os romances de Jacques, Pierre ou Paul (ou Janine, Suzanne ou Michele) que iam encobrir a Europa ao longo dos dois séculos seguintes.

A principal pergunta era a da ordem.

De um lado, havia os adeptos da ordem e da organização perfeitos, representados, digamos, pela Teoria sagrada da terra de Burnet, a Ordem divina de Süssmilch, o Espetáculo da natureza de De Puche, o Filósofo religioso de Nieuwentijdt ou por Leibniz pelas suas obras múltiplas e fascinantes. Do outro, não Voltaire, cuja crítica de Leibniz não é mais do que a reclamação jornalística, mas, por exemplo, de Holbach, cuja forma é em sua imaginação o homem encontra no modelo que ele chama de ordem, ou que pede, talvez ainda de modo mais radical: «De que privilégio particular goza essa pequena agitação do cérebro que nós chamamos de pensamento, da qual nós devíamos ter tornado o modelo do universo?». Hume desconfia de qualquer cosmogonia que se pretende completa, abomina todos os discursos sobre os «mundos perfeitos» - na arte da «criação dos mundos», ele vê mais um processo interrompido, de efeito e de erro e mantém a ideia de que a natureza contém «uma quantidade infinita de causas e de princípios».

Qualquer pessoa que tentar viver a vida plenamente, com um mínimo de ideias pré-concebidas, recusando a resignação fácil e o cetismo leve, deve ter o sentido de um mundo em movimento ao mesmo tempo real e ideal, aliado à sensação de harmonia e de totalidade mais ou menos distantes, mas também estar pronta para aceitar as rupturas, as interrupções, as fraturas. E a última palavra de sabedoria concernente  à relação entre o homem e o universo vem provavelmente de Herder, em sua Antropogeografia : « A criação viva por completo está em estreita correlação e deve agir com prudência quando se modifica essa interdependência».

O Diário do bordo de Lapérouse pertence a esse gênero de literatura, e Lapérouse era muito preocupado com o seu destino.

Inicialmente, ele era perfeitamente consciente de seu valor enquanto contribuição para a geografia. Ele tinha trazido precisões que poriam fim a muita confusão e incertezas, proibindo aos « geógrafos de gabinete » erigir sistemas segundo a fantasia deles. Lapérouse, como Cook, que tinha também visto absolutamente « sair », detestava esses construtores de sistemas que permanecem sentados em suas casas e se organizam para colocar em conformidade a realidade e suas ideias: « Na qualidade de viajante, eu relato os fatos e assino as diferenças ». Ele chega mesmo a dizer que um trabalho tal como o seu, trabalho de campo fundamental, porá fim à geografia enquanto ciência e tema de debate: « Nós acreditamos poder anunciar que o momento chegou ou que todos os véus dispersados sobre as navegações particulares vão ser retirados. A arte dos marinheiros progrediu o suficiente nesses últimos tempos para não mais ser interrompida por obstáculos parecidos ; logo a geografia não será mais uma ciência, porque o espírito de discussão e de crítica será inútil quando todos os pontos principais estiverem sujeitos a determinações exatas de latitude e longitude e todos os povos estão no momento de conhecer a extensão dos mares que os circundam e das terras que os habitam » (meus itálicos).

Aqui  a ciência.

Mas há também o aspecto literário.

Na edição, no Diário de bordo de Lapérouse, estabelecida pelo general Milet-Mureau em 1797, lê-se, em relação ao riacho de Sakhalin, que estava « cheio de salmão ». Se, no entanto, a gente se refere ao texto original de Lapérouse, publicado em 1985, na gráfica Nacional com os cuidados de Jonh Dunmore e de Maurício Brossard, vê-se que, sob a pena do navegador, o riacho em questão estava « pavimentado de salmão » - o que é uma expressão muito mais audaciosa. E isso não é apenas um exemplo entre muitos outros. O que me interessa aqui é a escrita espontânea de uma mente viva, curiosa e exploradora, que não obedece a nenhum cânion estético, a nenhuma ortodoxia literária.

 « Eu poderia ter confiado a redação de meu diário de bordo a um homem das letras, escreve Lapérouse em seu Prefácio. Ele teria sido mais puramente escrito e semeado reflexões às quais eu não teria nunca pensado, mas apresentar-se com uma máscara e os traços naturais quaisquer que sejam me pareceram preferidos ; lamentei muitas vezes, ao ler as duas últimas viagens do capitão Cook, que tinha pegado emprestado uma pena estrangeira de inicio : suas descrições dos modos, dos usos, das artes, dos diferentes povos, nunca me deixaram nada a desejar ; e os prazos de sua navegação sempre me ofereceram o traço da luz, que eu buscava para guiar a minha : é uma vantagem que é impossível para um editor de conservar e, frequentemente, a palavra que ele sacrifica para a harmonia de sua frase é aquela que um navegador teria preferido para o restante de sua obra. Não se pode aliás gostar desses tipos de leitura, sem desejar algumas vezes, colocar-se no lugar do viajante  e, a cada linha, encontrar apenas sua imagem, o ator que realizou o seu papel, mais elegante e mais Maneirado provavelmente, no entanto, o substitui apenas de modo imperfeito. Seus diferentes capítulos não foram de modo algum escritos à medida que ele viajou – os planos de sua navegação são apresentados de maneira uniforme, ainda que seja impossível não fazer nela mil mudanças quando eles são vastos e compreendem os dois hemisférios; seus reflexos não têm essa instabilidade, que nascia das menores circunstâncias; o homem das letras acaba por afastar de algum modo o viajante ...» (meus itálicos).

Entendemo-nos. Lapérouse não era oposta a certo esclarecimento de seu manuscrito : ele lamenta que, na ausência de um secretário, ele precise recorrer a copistas mais ou menos competentes, tendo como consequência a ortografia às vezes bizarra e a estranha pontuação que se encontra em seu Diário de bordo. E ele teria gostado de ter alguém que o corrigisse algumas incorreções – ele diz ter muito o que aprender com o « trabalho de escritor ». Mas isso ao qual ele se prende é a própria palavra, esclarecendo, que pode parecer bárbara para um ouvido « elegante ». E o que ele não quer absolutamente é que um texto múltiplo, pleno de detalhes intensamente percebidos, mas não necessariamente coerentes, seja reduzido à intriga bem conduzida e com estilo fluido de um « romance interessante ». Ele recusa a uniformização dos diferentes planos, em se tratando de navegação, de pensamento ou de escrita.

Enfim, com o Diário de bordo de Lapérouse, eu me encontro face a uma questão de ordem poética.

Aprofundemos um pouco tudo isso.

Um século depois de Lapérouse, em 1890, Anton Tchekhov, autor renomado, com várias peças e multidão de novelas para o seu crédito, partiu para a ilha de Sakhalin, justo do outro lado do estreito de Lapérouse. Ele tinha a intenção de viver algum tempo nessa « ilha envolvida de nevoeiros salgados » nos confins do Império Russo e de escrever um livro que não pareceria em nada com os que tinham lhe dado a reputação, uma espécie de livro sócio-etnico-geo-poético-meterológico ... Para se preparar para essa nova empresa, ele se transformou no elegante homem das letras, em uma « espécie de filho da puta erudito » enlatando todas as informações sobre as quais ele podia colocar a mão nas livrarias e nas bibliotecas de Moscou e de São Petersburgo. Uma vez na ilha, assaltado cada vez mais por informações diretas, ele foi confrontado com problemas de forma: como conferir unidade a todos esses materiais heterogêneos ? que tipo de forma lhe dar ? E, depois, com o contato direto da ilha, da situação, de sua estrutura e de sua atmosfera, ele constata mudanças em sua mentalidade : « Aqui nós nas bordas do oceano Pacífico... Lá, ao longe, se estende a costa da América... À esquerda, através do nevoeiro, percebe-se os promontórios de Sakhalin ... À direita, uma linha de falésias...E, ao redor de si, nenhuma alma viva, nenhum pássaro, nenhuma mosca. Nessas costas, a gente é atingido, não por pensamentos, mas por meditações. É assustador, mas ao mesmo tempo atraente. Eu gostaria de permanecer aqui, simplesmente para contemplar as ondas monótonas e para escutar seus rugidos ».

Eis aqui as premícias de uma literatura « não literária », se assim posso dizer. Como qualificá-la ? As categorias habituais tais como « viagem », « aventura », « exotismo », são não apenas impróprias, mas concernentes aos casos mais interessantes, e mesmo completamente ridículas. A ilha de Tchekhov – que considero apenas como exemplo, não como modelo - se apresenta como uma massa de prosa oceânica em que os fatos, as sensações e os documentos se entrechocam, tais como madeiras flutuantes. Melville realizou algo de parecido com Moby Dick. E Joyce, se ele tivesse vivido, teria escrito, após Ulysses e Finnegans Wake, um livro-oceano, uma espécie de maximum opus marinum.

Do mesmo modo que para os Gregos, Okeanos envolvia a terra, essa literatura (a literatura dos confins) - sobre a qual eu tenho que falar - tem seu lugar mental na borda extrema de nossa cultura e seu movimento físico consiste em uma tentativa de « abraçar » a terra de um novo modo para retomar o contato com o universo pela atenção múltipla e simultânea (mais rápida e mais sutil do que a simples justaposição), cuja lógica, erótica e errática, não tem nada a ver com as lógicas em curso.

A essa literatura dos confins, a teoria habitual é incomum. Poucos teóricos, que eles se deixem guiar por seu gosto ou pela ciência (literária), têm consciência desse campo e desse movimento.

Roland Barthes, na França, tinha a intuição disso. Após ter demonstrado, no Grau zero da escrita, que nossa « boa » literatura era irremediavelmente classicista ; no Império dos signos, ele fala sobre um « sonho » : « conhecer uma língua estrangeira (estranha) e, no entanto, não compreendê-la ...aprender a sistemática do inconcebível : desfazer nosso « real » sob o efeito de outros cortes, de outras sintaxes, descobrir posições inéditas do sujeito na enunciação, deslocar sua topologia ...Tal capítulo de Sapir ou de Whorf sobre as línguas chinook, nootka, hopi, de Granet sobre os chineses, tal resolução de um amigo sobre o japonês abre o romanesco integral, cujos alguns únicos fragmentos podem dar a ideia (mas nenhum romance) que permite perceber uma paisagem que nossa palavra – aquele da qual somos proprietários – não podia a preço algum nem adivinhar nem descobrir » (meus itálicos).

Barthes tinha a intuição, mas ele não foi, ele não pôde ir até a « iniciação ». E ele duvida que o romanesco integral seja o melhor termo para designar do que se trata, o que desponta no horizonte. É evidente que nos faltam palavras : novas palavras para novas práticas. « Novidade integral » se aproxima um pouco mais disso. Mas talvez o que Whitehead, em Process and Reality , designa por « produção de novos conjuntos » nos faça circunscrever ainda mais perto.

Lapérouse falava sobre o fim da geografia, isto é, da época em que a cartografia não seria mais um problema. Isso era provavelmente um pouco prematuro, pois mesmo no sentido puramente científico do termo (medir e situar), há muito ainda para fazer. E depois, a geografia pode avançar, pode haver ai outras geografias. E pode haver ai uma geografia.

Era – ao menos é assim que eu o interpreto – alguma coisa dessa natureza que Archibald MacLeish tinha em mente quando ele escreveu esse poema, que me acompanha há algum tempo :

Houve um tempo para as descobertas

Para as direções iminentes

Na luz nascente e as olas e o

Grito das gaivotas; e a curva da

Costa Norte que se fundia no desconhecido

Esse tempo é passado

 

As últimas terras povoaram-se

Os oceanos são no momento conhecidos

Senora :  todos os mapas no momento estabelecidos

Mais vale ser morto do que descobridor de contienentes.


Um homem teria feito melhor nunca ter nascido

Do que encontrar no oceano flores oceânicas

Trazidas desde as ilhas onde não há ilhas

Ou, à meia noite, fora da vista de qualquer ilha

Sentir no ar que muda o perfume do alecrim

Não há pior destino do que esse triste destino

Observar no horizonte da noite

Segura como o sol e o mar, uma terra nova

Surgida de um oceano onde nenhum acostamento é possível.

 

Terra nova, diz MacLeish

Digamos, novo mundo poético.

 

Lapérouse, como eu disse, provavelmente, um pouco inocente no que diz respeito ao fim da geografia, era provavelmente um pouco inocente também em sua recusa a qualquer sistema. Para poder dizer o que quer que seja, talvez mesmo para poder ver o que quer que seja, nós precisamos de um sistema qualquer. Mas, o que é necessário é guardá-lo flexível e fluido, oscilando perpetuamente entre o vazio e o fenomêno, não tentando subordinar a realidade a qualquer ideia, nem descrevê-la em sua totalidade.

Sistema aberto, com passagens e brechas, em que a mente permanece aberta.

Um mapa e um sistema. Como diz o lógico, ele nunca é o território, mas pode sugeri-lo, nos iniciar ao território e nos permitir ultrapassá-lo - para ir em direção às abstrações vivas.

E, cada língua é um mapa, é evidente.

O mapa, nunca terminado, de um mundo em emergência.

Tudo aqui representa uma tentativa de abordagem - não se atinge nunca completamente a meta - de uma poética do (novo) mundo.



Kenneth WHITE

(Tradução de Jordélia Mendes Brandão)