Por volta de 1954, na Universidade de Glasgow, eu lia Estudo da História de Arnold Toynbee. Estava particularmente interessado no volume 9, que tinha acabado de ser publicado e continha a décima segunda e última parte da imensa obra: As Perspetivas da Civilização Ocidental.

Ao longo de seu estudo, Toynbee analisou cerca de vinte civilizações conhecidas pela humanidade desde os primórdios. Nesta última parte, concentrava-se na etapa final da civilização ocidental que denominava sua fase “pós-moderna” (acredito que tenha sido o primeiro a usar esse termo), a qual, segundo ele, tinha começado em 1919, ou seja, no final de uma guerra que ficou conhecida como “a guerra para acabar com todas as guerras”. Contudo, em 1954, já podíamos chamá-la simplesmente de Primeira Guerra Mundial, considerando que, depois dela, vieram a segunda e até uma potencial terceira.

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O Instituto Internacional de Geopoética existe, continuamente, há trinta e cinco anos, o que significa que a sua fundação repousa sobre bases sólidas, constatadas ao longo do tempo.

Kenneth White, seu fundador e presidente até 2013, morreu em agosto de 2023 não sem antes ter preparado devidamente o futuro.

Mas retomemos, por ora e, limitando-se ao essencial, ao movimento geopoético.

Fundado no dia do aniversário de Kenneth White, dia 28 de abril de 1989, o Instituto Internacional de Geopoética viu afluir rapidamente pessoas apresentando novas perspectivas existenciais e intelectuais - frescor inédito. É a época do aparecimento dos Cadernos de Geopoética, no qual White agrupa contribuições transdisciplinares, abrangendo o campo que a sua obra abria à confluência da arte, da ciência e da filosofia. É a época em que surge o ensaio O Platô do Albatroz (1994), Introdução à geopoética à qual nunca deixaram de invocar aquelas e aqueles que queriam compreender as bases dessa teoria-prática. É, de igual modo, a época, sob o plano organizacional, em que White propõe uma “arquipelização” do Instituto (1993) para favorecer a criação de grupos de pesquisa aqui e lá na França, na Europa e no mundo. Iniciativa coroada com sucesso, já que dezenas de centros emergiram rapidamente.

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1.    Um lugar

Início da década de 1960, uma palavra aparecia cada vez com maior frequência em meus cadernos: Ardecha. Mais tarde, eu soube que, para Stéphane Mallarmé - um dos poetas franceses mais interessantes do século XIX, que tinha ensinado, por certo tempo, inglês em Ardecha - no colégio de Tournon, 1863-1866 -, a palavra significava “a arte e a miséria”. Ela significa isso para mim também, e ainda muito mais.

Nesse “muito mais”, havia, primeiramente, uma geografia.

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Preâmbulo

De uma forma geral, a literatura do nosso tempo deixa, por assim dizer, muito a desejar. Ela apresenta um espetáculo pot-pourri confuso, em parte trivial e em parte inexprimível. As livrarias acumulam tudo em suas prateleiras, pelo menos por um tempo – as bibliotecas fazem o mesmo, de forma mais permanente. Para se livrar da fama de nostalgia empoeirada e para se sentir “conectado” com o presente, as secções literárias das universidades propõem qualquer coisa (segundo métodos psicanalíticos, semióticos, etc. – ostentando seu cientificismo). Quanto ao conteúdo dessas produções, que descrevi como “confusas”, “triviais” e “inexprimíveis”, trata-se de uma espécie de mistura psicossociológica e sentimental, que conscienciosamente endossamos acrescentando, dependendo de cada caso, várias doses de cor local, convencendo-se assim de que um trabalho cultural está a ser realizado.

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